Polifonia e monologismo: uma análise de crime e castigo
Autora:
Hélen Cristina Pereira Rocha
ISBN
978-65-88580-55-4
DOI:
10.47573/aya.88580.1.2029
N° páginas:
50
Formato:
Livro Digital (PDF)
Publicado em:
2021-01-29
Área do Conhecimento
Licença:
A proposta deste livro é a análise do romance Crime e Castigo (2001), do autor russo Fiódor Mikhailovich Dostoiévski, observando seu processo de composição. Por meio deste trabalho, pretende-se compreender as principais características do romance polifônico, teorizado por Mikhail Bakhtin, e confrontar partes do livro que apresentam a presença da polifonia, como forma de se contrapor à ideia de um romance exclusivamente monológico. Nosso trabalho, portanto, na tentativa de estabelecer argumento consistente, que comprove a hipótese de que o romance Crime e Castigo possui um final polifônico, ao contrário do que afirma Mikhail Bakhtin, ao classificar o epílogo da narrativa monológico, realiza um estudo comparativo entre episódios semelhantes nos quatro primeiros capítulos iniciais e no epílogo do relato.
Nascido em 1895, na Rússia, Mikhail Mikhailovich Bakhtin, um dos grandes pensadores século XX, lançou-se no cenário mundial como critico literário e pesquisador de grande valia aos estudos linguísticos. Os livros A cultura popular na idade média e no renascimento – O contexto de François Rabelais – referência obrigatória aos que se dedicam à história do riso e à cultura popular, tendo como objetivo principal a compreensão da influência da cultura cômica popular na obra de François Rabelais; e Problemas da poética de Dostoiévski, o qual possibilitou a mudança do foco crítico sobre o autor, uma vez que dá relevo às peculiaridades estruturais das composições de Dostoiévski – são, ainda hoje, importante metodologia crítica para percorrer a literatura de Dostoiévski e tem fomentado importantes pesquisas sobre a literatura, de um modo geral.
Com a publicação desses livros, Bakhtin funda conceitos teóricos, entre eles a carnavalização, o dialogismo, a polifonia, a heteroglossia e uma nova noção de gêneros literários, que hoje desempenham papel fundamental nas analises literária e linguísticas.
Apesar de destacar-se como elementar colaborador dos estudos literários, Mikhail Bakhtin opera decisivas alterações no sistema de análise linguística então existente ao considerar que elementos tais como a história e o sujeito devam ser observados ao se estudar a língua ou se analisar um discurso. Nessa perspectiva, Marxismo e filosofia da linguagem inaugura uma nova forma de se pensar o discurso e se constitui em um dos pilares fundadores da análise do discurso literário, como bem aponta Brait:
Marxismo e filosofia da linguagem é a obra que chama a atenção dos lingüistas e que realmente representa um marco, uma mudança de paradigma […] que recupera para os lingüistas a dimensão histórica, social e cultural da linguagem. (BRAIT, 2001 apud FERNANDES, 2003, p. 30).
Nessa perspectiva, em Problemas da poética de Dostoiévski (1997), obra que constitui principal elemento do nosso corpus teórico, observa-se que Mikhail Bakhtin inova à medida que postula Dostoiévski como o criador de um novo gênero literário: o romance polifônico, fato que provoca grande efeito na crítica literária do momento, que se vê em face de admitir ter, até então, analisado uma obra de tamanha grandiosidade narrativa, Crime e Castigo, de forma simplória, observando-se tão e somente as peculiaridades pertinentes à estrutura das personagens, como se elas fossem apenas uma reprodução dos pensamentos do autor. É então neste sentido que Bakhtin (1997) afirma que o romance de Dostoiévski constitui-se de um todo polifônico, no qual se nota a presença de múltiplas vozes que revelam a existência de personagens que desfazem a monologia, típica do gênero, e projetam no texto suas próprias ideologias, tornando o texto extremamente dialógico e polifônico. As teorias polifônica e dialógica são levantadas e aplicadas por Bakhtin em meio literário e para isso utiliza do romance de um renomado autor, também russo, Fiódor Dostoiévski.
Fiódor Mikhailovich Dostoiévski, nascido em Moscou no dia 30 de outubro de 1821, é dono de um estilo único, incomparável; suas narrativas são chamadas de “romances de ideias”, sempre cheias de dramaticidade e envoltas por uma nova forma de fazer literário. Perpertuando-se como um dos maiores escritores russos e um dos célebres autores de todos os tempos, Fiódor Dostoiévski publica em 1866 o livro Crime e Castigo, romance no qual nos é apresentada a história de um jovem que se impõe um desafio: transpor a barreira (por ele estabelecida) entre homens do tipo “Ordinário” e os do tipo “Extraordinário”. Para tanto, arquiteta um roubo a uma senhora idosa, com o objetivo de tornar-se um homem “extraordinário”, que para ele seria uma classe superior de homens, aqueles que não se sujeitam às leis, que as transgridem e não se “acorvardam” diante de situações complicadas. O desenrolar do romance é magistralmente elaborado de forma a dar vazão a uma série de questionamentos levantados pelo protagonista, Raskólnikov, que é acometido por delírios febris em decorrência do profundo sentimento de culpa que sente após cometer o assassinato, o que o leva a confessar o crime cometido. Por meio de Crime e Castigo, Dostoiévski nos permite conhecer diferenciados tipos humanos condensados em uma narrativa única, que revela uma Rússia plena de miséria. Em Crime e Castigo, o autor posiciona-se de forma excepcionalmente nova, pois narra uma trama em que, aos sujeitos, é proporcionada a opção de se projetarem de forma autônoma, já que possuem consciências independentes da força ideológica do autor. Dostoiévski está, assim, isolado, pois não tendo precursores, funda um novo tipo textual, o romance polifônico.
Far-se-á neste estudo, em seu primeiro capítulo, um breve rastreamento acerca do conceito de polifonia e de monologismo. No segundo capítulo será realizada a análise de partes-chave do romance a fim de se demonstrar a polifonia existente ali. No terceiro capítulo se discutirá o suposto equívoco de Bakhtin ao conceituar o final do relato como monológico.
Hélen Cristina Pereira Rocha
Hélen Cristina Pereira Rocha
Doutoranda em Letras/ Estudos literários pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), mestre em Letras/ Estudos literários pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES (2012) e graduada em Letras/Português (2009).Tem experiência no ensino e na pesquisa na área de Letras atuando principalmente na investigação dos seguintes temas: Língua portuguesa, Língua portuguesa e ensino, Teoria da literatura, Literatura Brasileira, Literatura de Minas, Guimarães Rosa, Relações de Poder, Relações Étnicas, Gênero e Alteridade.